segunda-feira, 5 de março de 2012

Por Demônios Seja Guiado

Quando eu era mais jovem, gostava muito de fazer um som com os amigos. Devido à falta de talento, minha única opção era o vocal, pois nunca me dei bem com outros instrumentos. Em 2004, eu fazia parte de uma banda cover de Megadeth com alguns amigos e fiz apenas um show com eles, em Agosto. Embora a apresentação tenha sido boa, aquela seria a última vez em que eu subiria a um palco em muitos anos.

Eu gostava daquela banda. Saí da mesma por motivos bobos. Uriel e eu não estávamos nos dando muito bem por falta de maturidade de ambos na época, enquanto que Hermes não parecia mais tão interessado em prosseguir. Os únicos com os quais eu não tinha problemas eram Bruno e Maikleidson. Os anos foram se passando e Uriel e eu voltamos a conversar numa boa. Hermes sofreu um acidente fatal de carro em 2006.

Recentemente, pouco antes de minha viagem a Montes Claros, Bruno me convidou a fazer uma participação especial em um show do cover de Sepultura/Pantera do qual ele faz parte como guitarrista – assim como Uriel, no baixo. Eu achei que seria uma boa e aceitei o convite, escolhendo Strength Beyond Strength (Pantera – Far Beyond Driven, 1994) como sendo a música da qual eu gostaria de cantar. Como o show estava marcado para acontecer no Carnaval, fiz minha viagem a Montes Claros, regressei e aprendi a letra da música rapidamente. Estava tudo certo.

A banda faria dois shows em dias seguidos. O primeiro deles seria no Blues Pub, um bar em Taguatinga, no Sábado (18). Naquele dia, às nove da manhã, Bruno me liga pedindo para eu ir ao ensaio para quebrar um galho, pois Daniel, o vocalista, não poderia comparecer. Me arrumei rapidamente e fui para o estúdio. Mesmo morando mais longe do que os outros, fui o primeiro a chegar. O ensaio não foi bom para mim, pois fazia tempo em que não escutava algumas das músicas, o que me fez esquecer certas passagens. Mas, ao menos, eu sabia que aquilo era apenas um ensaio e que Daniel estaria presente à noite.

Após dormir quase o dia inteiro por ter saído com o Hernanny (que veio passar uns dias em Brasília) na noite anterior, chegado tarde em casa e não ter dormido muito antes do ensaio, me arrumei para ir ao show. Fui buscar Lande (namorada do Bruno) e nossa amiga Milly na casa deles e, ao sair de lá, Bruno me ligou do local do show avisando que Daniel não iria aparecer e que eu teria que cantar o show inteiro. Naturalmente, me senti bastante tenso, pois os caras eram meus companheiros de longa data e eu simplesmente não poderia dizer “não!”, mesmo sabendo que corria o risco de passar vergonha por não saber as letras de nove em dez músicas completamente.

Ao nos encontrarmos ao lado de fora do bar, entrei no carro do Bruno para poder ouvir melhor as músicas do set list e prestar atenção nas passagens e entradas dos vocais. Quanto às letras, não havia nada a ser feito, pois seria impossível decorar tudo em tão pouco tempo, especialmente porque faríamos a primeira apresentação da noite. Logo, não me foquei tanto nessa parte. Depois, levamos todo o equipamento para dentro do local. Marcelo havia trazido sua bateria inteira, que levou certo tempo para ser montada, atrasando ainda mais os eventos estabelecidos.

O “palco” era apenas uma plataforma de madeira de aproximadamente dez centímetros de altura. Isto não seria um problema, caso parte do piso não estivesse afundada, impossibilitando que eu me movimentasse bastante sem correr o risco de cair. A solução foi não sair do lugar durante todo o show. De acordo com o Hernanny, minha voz estava audível, mas não tão alta, o que achei ótimo, pois assim disfarçaria o “embromation” que, para um professor de língua inglesa, é vergonhoso e inaceitável (mas eu não tinha escolha).

O lugar não estava muito cheio, mas do ponto de vista do palco parecia estar tudo certo. Tive a impressão de que estávamos fazendo um bom show e que os poucos perto de nós estavam se divertindo. Ao perceber isso, me senti bem mais à vontade e passei a gostar de estar em um palco novamente, ainda mais com dois dos caras presentes na última vez, tantos anos atrás. Boas lembranças emergiram naquele momento.

O término da apresentação foi um alívio. Apenas pelo fato de eu não ter sido vaiado já foi uma vitória (assim como quando O Troco do Fiado foi exibido no Festival de Brasília). Até ouvi alguns elogios, o que eu não esperava, dada a minha falta de preparo na voz e nas letras e inexperiência no palco.

O show do dia seguinte foi no Carnarock, festival anual de Brasília que teve sua edição de 2012 no Cruzeiro. Dessa vez, Daniel estava disponível para se apresentar, o que me permitiu curtir o show apenas como espectador e fazer minha participação especial, tudo o que também deveria ter ocorrido na noite anterior. O local da apresentação estava bem cheio e havia muita gente em frente ao palco (inclusive eu) agitando bastante durante as músicas. Perto do fim, o próprio Daniel me convidou a juntar-me à banda para interpretar uma música em seu lugar.

O show estava tão bom que eu subi ao palco com o jogo ganho. Àquela altura, qualquer música seria bem-vinda, mas Strength Beyond Strength, com suas diversas variações de andamento, arrancou diversas respostas (positivas) da galera. Para mim, foi um momento mágico que ainda me causa arrepios, uma aventura breve, porém intensa, como há tempos eu não tinha. Não me lembrava mais de quão boa é esta sensação de estar em frente a várias pessoas se divertindo e deixar de lado, ainda que por alguns instantes, minha timidez (que, felizmente, está bem mais controlada e contida do que antigamente).

Não há nenhum vídeo desta participação especial, que mesmo sozinha valeu bem mais do que um show inteiro na noite anterior. O local era melhor, o público era maior e mais empolgado e o som estava perfeito, como eu nunca havia escutado antes em um show underground. Apesar da falta de lembranças físicas, este se tornou mais um daqueles seletos momentos que guardarei comigo por muito tempo, ou, quem sabe, pelo resto da vida.